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A revalidação de diploma estrangeiro de residência médica possui um trâmite muito peculiar. Regida essencialmente pela Resolução n. 8, de 7 de julho de 2005, do Conselho Nacional de Residência Médica (CNRM), o médico precisa submeter a documentação de sua formação à instituição pública nacional que possua o mesmo programa cursado no estrangeiro ou similar. Esta, por sua vez, deve encaminhá-la para análise do CNRM. Ou seja, a instituição instrui formalmente a documentação, agindo como espécie de intermediária, mas a decisão sobre a revalidação cabe exclusivamente ao CNRM, órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC), localizado em Brasília.

Ao concentrar a análise dos casos submetidos por instituições públicas de todo o país, há certa demora do CNRM em apresentar devolutivas sobre os casos, o que compromete o registro e o exercício da especialidade do médico no país. Inicialmente, o órgão realiza análise formal dos documentos, cuja ausência de eventual comprovação pode comprometer o andamento do pedido e de sua análise de mérito, culminando em seu arquivamento.

Há situações em que o arquivamento ocorre porque o médico não demonstrou que realizou residência pré-requisito. Isto é: para algumas especialidades, de acordo com a legislação brasileira para cursos de residência realizados no Brasil, é necessário concluir residência pré-requisito para depois realizar outra especialidade. Por exemplo: se um médico pretende cursar a residência médica em Oncologia no Brasil, primeiro ele precisa realizar a residência médica na especialidade pré-requisito de Clínica Médica, para então cursar Oncologia. Essa exigência, por sua vez, não ocorre em outros países, como Inglaterra e Cuba, de maneira que o médico pode cursar Oncologia como primeira residência, sem necessidade de pré-requisito, portanto. Com essa exigência e o consequente arquivamento dos pedidos, os médicos ficam completamente impedidos de exercer a especialidade no país, uma vez que tampouco faz sentido se dispor a realizar a residência de pré-requisito no Brasil para posteriormente revalidar a do estrangeiro, já que a primeira antecederia a segunda e não o contrário.

Essa interpretação do CNRM, no entanto, nos parece equivocada e questionável: não cabe a aplicação das regras sobre as residências realizadas no Brasil para a revalidação de diplomas de residência estrangeiros. Primeiro porque esse requisito simplesmente não está disposto na Resolução n. 8/2005; e segundo porque cria distinção entre aqueles médicos que cursaram a especialidade no exterior e no Brasil, já que os primeiros cursaram a residência sob regras distintas, o que os impede de seguir com o processo de revalidação no Brasil.

Como em outros casos de revalidação de diploma estrangeiro, naturalmente haverá distinções entre o curso realizado no exterior e o nacional. Por isso, cabe ao CNRM avaliar de forma abrangente, considerando as matrizes formativas, sem exigir, contudo, similaridade absoluta porque esta é impossível de ser alcançada e, claro, observar os parâmetros legais específicos para a revalidação de diploma estrangeiro de residência médica.

Por isso, a decisão pelo arquivamento pode ser objeto de ação judicial, a fim de pleitear a continuidade do trâmite do pedido de revalidação, para que possa seguir com a análise de mérito, sem a exigência, portanto, de residência pré-requisito. As regras precisam ser claras e não devem criar distinções, sob pena de impedir o exercício de especialidade muitas vezes cara e necessária para o próprio país.


Alynne Nayara Ferreira Nunes é sócia do Ferreira Nunes Advocacia, escritório especializado em Direito Educacional. Mestre em Direito e Desenvolvimento pela FGV Direito SP. E-mail para contato: alynne@ferreiranunesadvocacia.com.br.