Na série catalã Merlí (Dir. Héctor Lozano), o jovem Ivan Blasco foi vítima de bullying na escola. Seus colegas o chamavam de estranho porque tinha o hábito de ler jornais e grifar trechos que lhe pareciam relevantes. Os alunos o excluíam porque este comportamento não era comum aos demais.
Ivan se sentia cada vez mais inseguro e rejeitado no ambiente escolar. Frequentar a escola se tornou um desafio. Foi tão difícil lidar com as violências, que Ivan desenvolveu agorafobia, transtorno de ansiedade que o impedia de sair de casa e levar uma vida social.
Durante a série, Ivan progride e retorna ao colégio, o que somente é possível com o apoio da comunidade escolar – alunos e professores, especialmente o professor Merlí, de Filosofia. Os colegas de Ivan conscientizam-se de suas ações, após Merlí estimular o pensamento e a reflexão filosófica.
Casos como o de Ivan não são incomuns; pelo contrário, são recorrentes os relatos de alunos e de alunas que sofrem violência física ou psicológica com o objetivo de intimidar ou agredir a vítima. O ambiente escolar, que, por natureza, deve se inclusivo, torna-se um ambiente de exclusão, apresentando obstáculos para conviver com as diferenças.
A legislação brasileira tem apresentado avanços a esse respeito.
Em 2015, foi promulgada a Lei n. 13.185, que criou o “Programa de Combate à Intimidação Sistemática”. A norma é relevante porque define o bullying, além de criar medidas preventivas e de apoio às vítimas.
Em 14 de maio de 2018, foi promulgada a Lei n. 13.663, que inseriu na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a LDB, a incumbência de os estabelecimentos de ensino “promover[em] medidas de conscientização, de prevenção e de combate a todos os tipos de violência, especialmente a intimidação sistemática (bullying), no âmbito das escolas”.
Assim, tem-se que as instituições de ensino, sejam públicas ou privadas, devem adotar medidas preventivas contra a prática de bullying.
O estudante que é vítima de bullying pode, nesse sentido, exigir a responsabilização civil da instituição de ensino, pois pode alegar que não houve medidas conscientizadoras ou mesmo a resolução de conflitos no ambiente escolar, afetando seus direitos de personalidade.
Por outro lado, as normas são relevantes para determinar parâmetros a serem adotados pela instituição de ensino. Ao criar medidas de prevenção e de conscientização, a instituição pode ter sua responsabilidade mitigada em eventual ação judicial.
Além disso, é preciso criar mecanismos de resolução de conflitos, dentro das escolas, que conte com a participação dos alunos, que, por sua vez, também devem ser conscientizados e colaborar para que o ambiente seja inclusivo e apto a conviver com as diferenças. Eles podem colaborar, também, na definição de estratégias preventivas. O próprio caso de Ivan, retratado na série, pode ser tematizado em sala de aula e contribuir para a reflexão e tomada de decisão.
Ao construir diálogo com todos os atores da comunidade escolar – pais, alunos, professores e funcionários – é possível combater o bullying, estimulando a inclusão, o que, sem dúvida, impactará sobre a formação dos estudantes para viver em sociedade democrática.
Alynne Nayara Ferreira Nunes é advogada fundadora do Ferreira Nunes Advocacia e mestre em Direito pela FGV Direito SP. E-mail para contato: alynne@ferreiranunesadvocacia.com.br. Contate-nos, também, via Whatsapp: 11 970491696.